segunda-feira, 28 de setembro de 2009

O décimo primeiro mandamento


Creio que há um décimo primeiro mandamento que nos foi sonegado por Moisés. Ou foi o primeiro, não importa, que foi substituído posteriormente por alguma interdição. Sim, creio que o primeiro (ou décimo primeiro) mandamento foi "admirarás o belo". Assim mesmo, taxativo, imperativo, afirmativo. Sim, extasiado com suas visões, ele deve ter dito: "como é belo!"; mas o belo, logo percebeu o escriba, tem algo de herético, algo que nos desvia do caminho que tranqüilo seguíamos. Ele deve ter achado melhor algo como "amarás a deus sobre todas as coisas".


Assim são as pernas das musas: belas. Daquele tipo sem "junteiras", torneadas, coxas longas e batatas da perna "ao dente", apoiadas sobre tornozelo finos e pés de bailarina - como outrora revelou-me a musa. Aquelas pernas que dançam nas nossas cabeças e, com seus passos fátuos flutuam sobre as pedras do caminho. Ou deixam-nas macias sob seus pés, fazendo-nos esquecer - nós que observamos - que as pedras existem. Enciumadas as pedras, pelo olhar pagão dos reles mortais, arrancam nossas distraídas unhas para mostrar o legado terreno.



Um walkin bass aveludado, bem executado, bem pode nos aproximar do efeito dos passos de alguma musa em seus descompromissados passeios diários sobre o coração dos mortais. Uivamos para a lua, como uiva o sax de Eric Dolphy quando toca seus blues. Talvez não precise mais do que três segundos para o mortal cair no abismo, no turbilhão que o caminhar da musa provoca. Dolphy, aliás, tentou traçar alguns retratos sobre as musas e os efeitos por elas provocados: Miss Ann, Dianna e Serene são algumas delas. Alegres, vivazes, sedutoras, delicadas e... cuidem-se, amigos, pode haver pedras no caminho. Os uivos do Eric são prova disso

Quem quiser ouvir Eric, corra atrás da caixa com as gravações para a Prestige. São nove cds com sessões realizadas no período compreendido entre 1º de abril de 1960 e 8 de setembro de 1961.
Curtam uma seleção ali no pocast Quintal do Jazz
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11 comentários:

Érico Cordeiro disse...

Agora o cabra foi longe...
Uma caixa logo?
E com 9 cds?
Não é mandamento, mas tá na oração: "tende piedade de nossos pobres cartõezinhos".
Acho que a fase do Dolphy na Prestige é bem mais interessante que na Blue Note (por onde saiu o cultuado Out To Lunch).
São discos (tenho poucos, é certo) criativos mas bem menos herméticos, como o Out There, o Where (com Ron Carter) e o The Quest (com Mal Waldron).
Excelente lembrança!!!!!

Salsa disse...

Acho que é dinheiro bem gasto, mr. Érico. A caixa tem momentos sensacionais.

figbatera disse...

Pela amostra - os 3 segundos - o trem é bão mesmo!

Salsa disse...

Vai que é, Olney. Dolphy tem um som algo agressivo, passional e envolvente.

John Lester disse...

É poesia para todo lado, aqui e acolá, no blog de Mr. Cordeiro. Para onde esse mundo vai?

pituco disse...

salsa san,

bacana mesmo o texto...expressionista...rs

é por isso que a música anima-se quando há uma bela musa, não é verdade?

e curtindo o quintal do jazz...valeô

abraçsons japacíficos

Salsa disse...

É, Lester, a coisa tá feia. Como vc já sabe, meu lance agora são as artes. Arrisquei-me com a pintura (a que ilustra o blog é a primeira), vou aprender tocar sax, clarineta e, quem sabe, escrever. Morrerei de fome, pois.
Tá certo, Pituco,
As musas iludem-nos quanto à leveza da Terra. E a gente sai por aí tocando como loucos.

Celijon Ramos disse...

Gostei bastante da sobreposição das idéias no texto aos sons do jazz de Dolphy.

Um abraço!

Salsa disse...

Demorou, mas apareceu. Valeu a visita, meu caro Celijon.
Apareça mais.

Sergio disse...

Olha, Salcéltico, só sei q essas beberragens em casa e ouvindo Música é o q me estimulam mais sair falando. Comecei a ler seu texto, mas a visão turva e a... (claro ela mesma!) preguiça, me desistimularam ir adiante. Então o papo q me trouxe foi uma postagem sua de 2007 no Jazzseen sobre Walace Roney, q dizia algo como "os críticos o comparam a Miles, mas todos os críticos comparam novos trompetistas a Davis"... Não colei seu texto, mas era algo parecido e melhor escrito.

Anfã seu Salsa, ouço o álbum q naquela mesma postagem vc dizia q ainda precisava ouvir: "No Room For Argument", meu caro, é o q ouço e o q me trouxe. Acho q afta de quem morde a língua cicatrizou já. Mas as 1ªs faixas do álbum, pra mim foram como se Miles, não só tocasse, mas regesse o Walace e sua gig!

Era isso. Enquanto escrevia o copo esquentava o líquido dourado da felicidade!... Que não pode parecer com aquele outro q só traz felicidade na mão invertida.

Seu mr. Salsa.......... Que belas pernas........ Calma. Tou falando da foto da postagi.

Salsa disse...

Meu cinquentenário amigo,
Há muito não ouço mr. Roney. Mas, como diz nosso amigo Lester, ele deve ser melhor que miles.
Acho que já está passando da hora de retornar a laguns passados discos. No espaço de dois anos, foram mais de 250 cds aqui postados (selecionados entre outras centenas) - isso impede de dedicar-me mais ao deleite da audição da discografia desses grandes músicos. Já tenho coisa demais para ouvir (o f*** é que sempre aparece mais).