quarta-feira, 3 de junho de 2009

Wynton Marsalis - He and she

Wynton Marsalis. Devo dizer que, às vezes, ele me irrita, outras vezes me faz parar para ouvi-lo. Dono de uma técnica exuberante, o trompetista parece ter uma alma bastante irriquieta em sua lida com a música - característica louvável. O que me irrita é que eu acho que falta em seus trabalhos um pouco mais de brincadeira, do lúdico, do sexo inerente ao jazz. A sua maneira de brincar me soa camerístico. Tenho a impressão que seus discos são muito arranjados. Pode ser uma grossa bobagem minha, mas parece que até os improvisos são escritos. Talvez isso seja apenas efeito de sua exuberante técnica. Que me digam aí os seus fãs.

Apresento-lhes agora um disco que me fez parar para ouvi-lo: He and she, gravado em agosto de 2007 e lançado há pouco mais de dois meses. O nome já diz tudo: trata-se da narrativa de um encontro. Mas não é apenas o encontro entre um homem e uma mulher (um garoto e uma garota), mas sim do encontro de ambos com as peripécias do amor. O casal é palco para Amor brincar.

Curiosa é forma adotada por Wynton: mesclando poemas e música, nosso herói vai tecendo a história amorosa. Os poemas introduzem-nos na história e a música dá o clima da coisa: das brincadeiras da infância (School boy), passando pelo medo (Fears) diante do universo que se apresenta até alcançar o primeiro beijo, a primeira vez (First kiss e First time). Achei que a forma funcionou bem.

Acompanham Marsalis, os jovens músicos Walter Blanding (saxofones), Dan Nimmer (piano), Carlos Hendriquez (baixo) e Ali Jackson (bateria). Destaco as faixas School boy, First slow dance, Girls! e A train, a banjo and a chicken wing. Esta última é um blues slow tempo com aquela aura on the road, como deve ser. Um disco que merece ser ouvido.

Curtam ali no podcast do jazz contemporâneo.

15 comentários:

figbatera disse...

Eu só tenho l disco do Winton Marsalis (Think of One)de que gosto bastante.
E o assisti ao vivo uma vez no Free Jazz-Rio - inclusive uma grande "canja" que deu no extinto Jazzmania. Foi muito bom!

ps.:Salsa, estou aguardando seu nº de telef.p/fazermos contato lá em R.O.

Celijon Ramos disse...

Pessoalmente, acredito que Wynton Marsalis tem as duas coisas no lugar: a improvização e a boa técnica que em muito também é produto de formação erudita. Irei ouvir este seu último trabalho que lhe entusiasmou tanto.

Obrigado!

Salsa disse...

Olney, meu velho,
já enviei meu nº pelo e-mail. Sabes que a organização deixa uns instrumentos para os amadores fazerem um som? Pois é, leve as baquetas e as vassouras.
Prezado Celijon,
Seja bem-vindo ao meu quintal. Eu realmente gostei desse disco. Os temas estão bem elaborados e bem interpretados. Pode conferir.

Érico Cordeiro disse...

Mestre Salsa,
Wynton Marsalis é um dos meus heróis, seja como músico, seja como personalidade musical (pesa, talvez, o fato de que alguns dos meus primeiros cds de jazz tenham sido dele, daquela séria série Standard Time, que rendeu, inclusive, um ótimo álbum tribbuto a Monk).
Wynton é o maior responsável pela renovação do interesse sobre o jazz acústico, fazendo grandes releituras do bebop e do hard bop, sempre com muita reverência aos seus predecessores.
Nãao conheço ainda esse álbum, mas pelo que ouvi no post e, sobretudo, pelos seus comentários mais que abalizados, estamos diante de um grande disco.
Além disso a capa é muito bonita!

Salsa disse...

Prezado Érico,
Nunca fui um grande fã de Wynton, mas seu trabalho merece atenção. Conheço os discos citados (fazem parte da minha discoteca), mas esse, por seu cunho autoral (inclusive dos poemas, que eu achei curiosos - mas podem ferir a sensibilidade dos letrados de plantão), pelos arranjos e pelas performances merece um tempinho da atenção dos apreciadores do jazz.

John Lester disse...

Curioso: um negro viciado, que batia em mulheres, exibicionista, pedante e que tocava muito mal o trompete é considerado genial, criativo, transgressor, formidável.

Agora um negro sóbrio, comportado, estudioso, educado, virtuoso, dedicado ao ensino, é considerado um chato de galocha.

Não trocaria meio Marsalis por 1.000 Miles Davis.

Passar bem, JL.

Salsa disse...

Ô, Lester, eu não acho o Marsalis um chato de galochas, mas, convenhamos, mesmo com seu virtuosismo, a sua obra é bem menos significativa do que a do Miles.
Quanto ao caráter dos nossos heróis, é melhor não colocar isso na balança. Prefiro vê-los como personagens (o que eles acabam se tornando) do que como entidades com cpf e os cambau.

figbatera disse...

Eheheheh! Essa "birra" do Lester com o Miles Davis dá uma boa "conversa"...
***
Ok Salsa, vamo ver se a gente consegue tocar um pouquinho lá!

fabiopires disse...

A discussão aqui está bem interessante e todos têm suas razões para criticar Marsalis e elogiá-lo, acho que todos os artistas têm seus pontos fracos e fortes.Marsalis é competentíssimo, dentro e fora do Jazz.Davis era competentíssimo dentro do Jazz.Pronto, falei (hehe).Gostei do blog e saúdo à todos.Abraços.Vida longa aos blogs de jazz !!

Salsa disse...

Valeu a retribuição, Fabio. Volte sempre.

Vagner Pitta disse...

Da mesma forma que os grande músicos do free jazz foram incompreendidos com suas explorações sonoras, Wynton é atualmente um dos músicos - senão o mais - incompreendido por seu discurso retórico e trompetístico em favor da busca pelo "jazz autêntico". Claro, ele soa pedante e e retóricamente limitado até pra mim que sou um dos seus maiores fãs que já conheci (falo com risos e com modéstia, claro), pois essa coisa de "jazz autêntico" me soa utópico, ainda que essa busca seja necessária, haja vista o volume de invencionices e misturebas que tentam se apropriar do requinte que o nome "Jazz" impõe ao gênero musical em si. Mas na história do jazz, nenhum músico foi tão poderoso e completo quanto Wynton Marsalis: Qual trompetista - ou músico de jazz em geral - soube transitar pelas mais variadas escolas do jazz ( lançando registros com New Orleans, Swing, Bebop, Hard Bop e até o Free) e ainda foi considerado o maior solista de música erudita da sua geração?

A maioria das pessoas que dizem já já ter ouvido Wynton Marsalis ainda não descobriu a sua obra e muito menos são capazes de descrever o músico: trata-se do trompetista que mais soube tocar com fraseados diferentes imprimindo seu estilo quente, forte, original e virtuoso. O fraseado de Wynton visto no disco clássico Think of One não é o mesmo fraseado visto no disco "Marsalis Plays Monk".

Outro fato é que o nome de Wynton ainda é atrelado apenas ao sucesso do seu virtuosismo e não à importância da sua composição. Mesmo que ele tenha sido o primeiro negro e jazzista a ganhar o Prêmio Pullitzer por uma composição de Jazz (Blood on the Fields, 1997), a maioria das pessoas não o enchergam como um dos maiores compositores de todos os tempos: para um leigo, colocar Wynton Marsalis nos mesmos patamares que Duke Ellington e ?Charles Mingus é um grande exagero, por exemplo. Mas é extamente isso que a isso que a história mostratá. Acredito que a maioria dos críticos já sabem disso, mas se retém em dizê-lo pelos seguintes motivos: pelo ódio que Wynton já cultivou com suas declarações até aqui e por se tratar de um músico e compositor relativamente novo e contemporêneo - é como se esses críticos estivessem deixando a tarefa de suma consagração à comunidade jazzística do futuro, pois já seria o cúmulo elevar Wynton ao estatus de Duke Ellington com ele em vida ou consagrá-lo mais do que ele ja é consagrado. Enfim, Wynton é um dos poucos compositores de toda a história do jazz a nunca lançar um disco igual ao disco lançado subsequente: ele muda de temática a todo momento e é um dos maiores mestres do arranjo. Falta as pessoas ouvir suas obras mais autorais com ouvidos atentos pra descobrir isso. Daí pra admitir é mais dificil, pois ninguém admite a genialidade de um músico que não gosta: é uma questão de passar por cima dos preconceitos!

Salsa disse...

Tens razão, Pita, quando aponta para a posteridade. A proximidade distorce nossa visão - para o bem ou para o mal. Assim sendo, eu prefiro ir devagar ao pote. Ouço, observo, "rumino" minhas impressões (principalmente quando o trabalho é mais autoral). O percurso de Winton pelas diversas dicções do jazz só mostram a sua grande habilidade. Há momentos, como no blue que eu postei, em que se percebe um aspecto interessante: ele se apropria de uma linguagem e impõe a sua forma de articulá-la. Muitas versões existem de blues que jogam com o barulho do trem sobre os trilhos, mas esse eu achei sensacional. Ele consegue injetar uma boa dose de contemporaneidade na tradição.

Vagner Pitta disse...

"Ele consegue injetar uma boa dose de contemporaneidade na tradição."

falou e disse!


ou o contrário: ele consegue injetar uma boa dose de tradição em suas peças contemporâneas!

Abraços!!!

osvjor disse...

Olá, eu já fui um grande fã do Wynton Marsalis, que conheci quando comecei a aprender trompete. O que ele faz é realmente um absurdo com o instrumento, ele é perfeito. Mas, mesmo naquela época e principalmente hoje, passados alguns anos, alguma coisa me incomoda(va) na música dele. Eu não conhecia identificar até que alguém me falou: o cara toca sem alma. Não que eu ache isso. Como é que um músico como ele vai tocar sem alma? Mas essa crítica de certa forma faz sentido. Eu poderia dizer de outra forma, que falta inspiração aos improvisos, ou que os improvisos não são bonitos etc. Num dos discos ele gravou "Yesterday", porque, segundo suas palavras, queria enfrentar o desafio de tocar uma música de notas longas, que o Miles já havia gravado etc, algo nessa linha. Embora o Miles tivesse 10% talvez da técnica do Wynton, a versão dele dá de 10. Outra coisa que eu não gosto, e que é mais comum do que eu gostaria de ver nesses young lions, é que ele faz discos conceituais, tipo contar uma historinha, passar uma mensagem, com trechos com narração ou coisa que o valha. Pô, não gosto desse troço, acho uma chatice, fica uma espécie de ópera de segunda, sei lá, me desculpem a ignorância. Mas eu continuo fã do grande, embora não um GRANDE fã. abs

Anônimo disse...

Sempre fui fã do Wynton, quer dizer...da primeira fase de sua carreira. Discos antológicos acompanhando Blakey e os seus primeiros discos solo, o álbum homônimo, Think Of One, Black Codes, J Mood e a série Standard Time.
Digo que Black Codes e J Moods estão entre os mais brilhantes discos de Jazz que eu conheço. Obras geniais, recheadas de extremo bom gosto, verve e técnica. Foi o auge da carreira dele. Já o projeto Lincoln Center e alguns álbuns como Blue Interlude, Thick In The South, Leeve Low Moon realmente me chateiam. O cara virou um enfadonho divulgador de New Orleans, tocando academicamente e negando a sua própria genialidade do passado. Até hoje não coneguiu mais recuperar o "fogo" do passado. Acomodou-se a um projeto que o diminui como músico. Ultimamente então, gravar discos com Willie Nelson e Eric Clepton parece ser o tiro de misericórdia e o ocaso de uma carreira outrora brilhante. Música erudita, Poesia, country music, Rock, carregador de bandeira, militância política...todos elementos que desviaram Wynton do melhor caminho do Jazz.