terça-feira, 30 de outubro de 2007

Tim: Eldar e Lisa

As minhas reticências em relação ao jovem pianista Eldar, enfim, não se concretizaram, pelo menos não em sua totalidade. Achei que Eldar ainda está procurando o caminho para alcançar aquela nota que ninguém nunca encontrou - a blue note. O que vi e ouvi, no entanto, permitem-me vislumbrar um futuro promissor. O menino, de rígida formação erudita, mostrou uma excelente técnica com ambas as mãos. Agradaram-me a precisão e a agilidade no desenvolver de seu fraseado (mão direita), e a pegada marcada por elementos percussivos do stride piano (mão esquerda), características que mostraram a perceptível influência que habita em seus dedos: Art Tatum e Oscar Peterson (com pitadas de Jelly Roll Norton). A razão da preferência por esses nomes é revelada indiretamente em sua opinião sobre o músico que grande parte dos jovens pianistas se apegam, a saber, Bill Evans. Para Eldar, Bill é excessivamente lírico. Pois é, o menino é chegado na volúpia dos pianistas clássicos do jazz. Outra coisa que chamou a minha atenção é o fato de o jovem, em meio a volúpia, às vezes ceder espaço ao silêncio - aquele silêncio que fermenta alguns belos e breves lampejos que sedimentam o que virá a seguir. Eu diria que Eldar está dando forma à sua alma. Torço apenas para que, nesse trajeto, ele não se perca e se precipite no ventre da besta do tecnicismo chulo, do hermetismo transcendental ou do comercialismo barato.
O segundo show da noite, da sueca Lisa Ekdahl, diante das críticas negativas que ouvi e li referentes às apresentações anteriores, fizeram com que eu me posicionasse estrategicamente próximo à porta. Qualquer coisa, eu fugiria. O ponto a favor da cantora, foi a fórmula adotada para o show. Proposta similar aos trabalhos da bela Julie London, ladeada, se não me engano, por Ellis e Brown. A sua (de Lisa) voz curta não resvalou em demasia para o desafinar galopante (deve ter aprendido até chegar em Vitória). O grupo parecia saber de suas restrições e não ousava nada além do trivial. O show, com aura instrospectiva e com arranjos minimalistas (creio que mais por deficiência da banda), agradou a platéia que lotava o teatro. A meu ver, o show não justificava a sua presença num palco de festival. No máximo poderia estar num pequeno bar.
Aguardemos o próximo, torcendo por um pouco mais de jazz na programação. Ou, pelo menos, com nomes que nos façam sair e retornar felizes para casa.

domingo, 28 de outubro de 2007

Joe Lovano Nonet: sensacional!

CD, o que eu ouvi e vi ontem à noite, no teatro da Ufes, lavou a minha alma. Refiro-me ao show do noneto de Joe Lovano. Foi realmente espetacular. Quando ele anunciou a homenagem ao cool jazz, citando o antológico disco "nascimento do cool", senti que o negócio seria de primeira. Arrepiei-me com o tema de abertura, On a misty night, de Tadd Dameron, que prometia o que realmenete sucedeu: um showzaço. Os arranjos privilegiaram as performances dos componentes do noneto. Não houve personalismos - todos deitaram e rolaram. As trocas de compasso, o naipe sutil, os temas escolhidos, tomaram de assalto uma embasbacada e educada platéia. Baixo, bateria e piano demonstraram uma coesão inefável. Encontrei o Salsa, que teve a mesma impressão (tiete do Monk, ele elegeu o tema Ask me now como o momento sublime do show). Quem foi, ouviu jazz da melhor qualidade. Uma justa homenagem ao que de melhor se fez no território do jazz. Irrepreensível. Vou correndo atrás dos discos. Se eles captarem 30% do que eu ouvi, já está valendo.


PS: Quanto ao Paulo Moura, não dá para comentar. Além de não ter conseguido ouvi-lo, eu não entendo de forró.

sexta-feira, 26 de outubro de 2007

Um Cedar, por favor

O pianista do disco "The cup bearers", de Blue Mitchell, é uma figura que, apesar de ter tocado com uma manada de jazzistas de primeira linha, mantém-se pouco conhecido e, obviamente, pouco comentado: Cedar walton. E não venha me dizer que ele não convence como pianista, pois isso é um contrasenso diante do que eu disse antes - ele tocou com deus e com o mundo (além de ser um competente compositor). Blakey, que sempre contou com bons pianistas, não chamaria um mané para tocar com ele. O pior é que eu tenho apenas um disco do Cedar como band leader - Manhattan afternoon -, no qual interpreta oito standards, acompanhado por David Williams (baixo) e Billy Higgins (bateria). O cd foi gravado em 1992, período marcado pelo crescente retorno às bases do jazz. O disco do trio de Cedar Walton mantém a verve do hard bop e, para mim, soou agradável. Confira as faixas The newest blues e The theme.

terça-feira, 23 de outubro de 2007

A terra de Harold

Como acertado, eu trago um disco de alguém que tocou com uma das estrelas dos posts anteriores (aliás ele não estava como mero sideman, ele dividia a cena com Blue Mitchell): Harold Land. A sonoridade do seu tenor não é aquela que costumamos ouvir dos instrumentistas da costa oeste. Seu fraseado é mais ríspido e joga notas com bastante agilidade. Alguns críticos identificam aí alguma influência de Coltrane. O disco "The fox", de 1959, me atraiu inicialmente por causa de um tema com estrutura pouco usual para a época, composto pelo pianista Elmo Hope (que participa do disco), chamado "Mirror-mind rose". Mas o disco é todo bom. Merece todas as estrelas possíveis. A banda é completada por Dupree Bolton (Trompete), Herbie Lewis (Baixo), Frank Butler (Bateria). Eu consegui esse disco num sebo na asa sul, aqui em Brasília. Harold nos deixou em 2001. Postarei duas amostras: The fox e Mirror-mind Rose.

segunda-feira, 22 de outubro de 2007

O conde

E por falar em harmonia, lembra-se de um disco de Count Basie que você me deu há alguns anos atrás? Pois é, na época eu torci o nariz e disse que parecia música de cinema decadente do interior, hoje é um dos que eu mais ouço (apesar de ainda guardar algumas reticências quanto ao seu modo de tocar órgão). Foi através desse disco que eu conheci o som de Frank Wess e Frank Foster, além dos feras Freddie Green (o guitarrista harmonizador - nunca sola), Thad Jones (t), Ed Jones (b), Eric Dixon (fl, ts) e Sonny Payne (d). Ainda bem que você insistiu para que eu ficasse com o disco. A elegância de Basie, para mim, põe no chinelo o seu contemporâneo Duke Ellington. É um som que refresca qualquer ambiente. Como você já conhece o disco, deixarei duas faixas para os estrangeiros que porventura passarem por aqui: Secrets e What'cha talking?

sábado, 20 de outubro de 2007

O Royal Flush de Byrd

Meu caro CD, as palavras são traiçoeiras. O melhor mesmo é ouvir música. Fiz uma visita a um blog de jazz (você viu) e deixei uma mensagem que causou mal-estar, e, ainda por cima, respingou em você - me desculpe, se aquilo te incomodou. Mas, la nave va, a vida segue. Desisti de visitar outras praças, mas não desisti do blog. O Jazzigo é o nosso meio de comunicação para falarmos do que gostamos: jazz. Quando tive a idéia de criá-lo foi com a intenção de trocarmos nossas informações e até uns discos. Como já combinamos, caso você não tenha um dos discos comentados, eu deixarei um arquivo naquele endereço para que você possa baixá-lo. E ponto.
E por falar nisso, para afastar o baixo astral, estou ouvindo o disco "Royal flush", de Donald Byrd. É o tipo de disco que faz a gente esquecer qualquer confusão (digo mais: faz com que a gente não entenda porque a confusão existe). O barítono de Pepper Adams, mais o piano de Hancock (totalmente acústico), o baixo cool de Warren (usa o arco também), um comedido Higgins na bateria e Byrd (num momento lírico e melódico soberbo) formam um conjunto de harmonia ímpar. O disco tem seis faixas, das quais eu separei Requiem e I'm a fool to want you. Se você gostar, deixe o recado.

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Mitchell e Land

Quando eu vi foto da primeira postagem feita por Vinyl, lembrei-me de quando nos conhecemos aqui em Brasília. Eu estava tocando violão na rodoviária, tentando descolar um troco. Vinyl foi o único que parou para ouvir, antes que o guarda me mandasse procurar serviço. Aquele momento e no seguinte, quando ele me pagou um almoço, nasceu uma amizade que, apesar da distância, se mantém acesa. Tanto que ele me convidou para colaborar com seu blog (nosso, agora). Lembro-me que foi ele que me apelidou de CD (meu nome é Carlos Dias).
Vou aproveitar que tem uns filmes aí do lado, e apresentarei mais um disco do Blue Mitchell. Desta feita, ao lado de Harold Land, excepcional saxofonista da costa oeste americana, com quem formou um quinteto, já no final de sua vida. Isso depois de ter experimentado vivências musicais diversas, ao acompanhar Ray Charles e o maluco blueseiro inglês John Mayal (será que essa trip teve a ver com o câncer?). O fato é que esse magistral músico não se apertava - chamou, ele tava dentro. Esse disco, Mapenzi, só pelo fato de unir esses dois monstros do jazz já é motivo para sua aquisição. Vocês terão a oportunidade de ouvir Mapenzi, Blue silver e Everything's changed.


Um abraço e até a próxima.


quarta-feira, 17 de outubro de 2007

O trompete de Mitchell

O meu primeiro post musicado não seguirá nenhum critério hierárquico. Não pretendo ficar estabelecendo listas de melhores e piores, ou do mais ou do menos importante para o jazz, pois, para mim, todos estão no céu, todos estão ao lado de Deus. Quero apenas partilhar a música desses santos. Começarei com um trompetista (que, dizem por aí, é um instrumento usado classicamente para derrubar muralhas).
Creio que Richard Allen (Blue) Mitchell (*1930 +1979), ao saber que o câncer estava devorando suas vísceras, encontrou na música o bálsamo para a dor que o dominava. Não sei se foi assim que aconteceu, apenas especulo. Sei apenas que, apartir de 1958, como band leader, a sua produção é extensa. Quando faleceu, em 1979, Blue Mitchell já havia gravado pelo menos uns trinta discos. Desses, eu só possuo uns poucos. Entre eles, o lp The cup bearers, gravado em 1962, para a Riverside. Vocês poderão conferir a sonoridade intensa desse jovem músico, que, confiram na capa, está acompanhado por Junior Cook (cujas intervenções com o tenor estão ótimas), Cedar Walton, Gene Taylor e Roy Brooks. Ouçam com atenção Turquoise, Dingbat blues e Cup bearers

terça-feira, 16 de outubro de 2007

O templo abre as portas

Sim. O jazz morreu. Ele ainda não sabe, mas é um fato consumado. Espírito indômito, ele insiste. Zumbi, caminha pelas noites à cata de algum lugar para despejar suas notas. Alma perdida, baixa, atraído, em algum médium que, incauto, solfeja alguma canção do seu repertório ou usa escalas e harmonias pouco convencionais em suas interpretações. Momento epifânico logo exorcizado por pedidos: aquela canção do Roberto, aqueloutra da Ivete, mais uma de...
Sim. Eu chorei quando o vi alquebrado, mas ainda com um leve brilho no olhar. E, movido pela emoção, construi esse templo para que ele possa se expressar. Aqui ouviremos, embriagados (mas em silêncio), suas belas pregações, seja através de suas antigas gravações, seja através dos jovens médiuns que ainda dão passagem à sua voz.
O templo estará com suas portas abertas 24 horas por dia.