sábado, 28 de novembro de 2009

Quatro bateristas agradam muita gente

A rapaziada costuma levar as coisas muito a sério, como se existisse essa seriedade toda. A minha implicância com baterista, por exemplo. Ela existe, do mesmo modo que existe com quaisquer outros músicos, digamos, excessivamente arrojados.

A gente está ali ouvindo um sonzinho, uma baladinha, quando, de repente, POU!, uma pancada intempestiva quase te derruba da cama. Às vezes pode ser apenas um problema de mixagem, outras vezes é efeito da mão pesada do camarada. Pode ser também um guinchado do saxofone fazendo a obturação do molar trepidar. Ou a verborragia do pianista que não suporta o silêncio entre as notas e por aí vai. Tudo isso é muito chato. A não ser quando é a gente quem faz, obviamente.

Agora, imagine-se numa casa com quatro baterista descendo a mão em seus tambores. O que pode parecer infernal quando pensamos a respeito, pode se revelar muito mais interessante quando ouvimos. Pois bem, estou às voltas com Louis Bellson, Shelly Manne, Willie Bobo e Paul Humphrey. O disco The drum session foi gravado em 1974, tendo Oliver Nelson como produtor. Os meninos passeiam por uma bem articulada série de variações ritmicas que agradará os fãs das baquetas e tambores. Destaque-se o pessoal que encarregado da harmonia e melodia: Bob Bryant (trumpete e flueghel), Jerome Richardson (Tenor e flauta), Mike Wofford (teclados) e Chuck Domanico (baixo).

Ouçam ali no podcast Quintal do Jazz.

Link: Avax

PS: A ordem dos solos: Bellson, Bobo, Humphrey e Manne.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Herbie Nichols

Em 2006, quando eu ainda era um dos bem remunerados redatores do Jazzseen, publiquei um post sobre o pianista Herbie Nichols. Na época, fiquei atraído pela sonoridade que ele extraía do seu piano. Soava-me monkiano. E não era para menos, já que Monk era um amigo próximo.

Uma das coisas que observei e mantenho foi o seu modo de jogar com a harmonia: "percebe-se com facilidade que o rapaz tem um arcabouço de informação musical que escapa à média dos músicos. Seu patamar musical permite-lhe brincar com os limites do bom senso harmônico e estabelecer fórmulas nas quais a tensão torna-se um campo surpreendentemente produtivo".

Na contracapa do lp que agora ouço, The prophetic, de 1955, o crítico Leonard Feather destaca o modo como Herbie vai brincando com terças menores (em The third world), explorando as sextas e as sétimas nos acordes (C6 Eb7 / Bb6 Db7 / Ab B6 e por aí vai). Antes que me perguntem: não saco muito dessa matemática, mas o resultado da operação é uma sonoridade pra lá de interessante. Pelo menos para mim, pois meus comparsas do clube das terças acharam-no algo monótono.

Um dado que não posso desprezar: a cozinha que completa o trio. O esporrento Art Blakey mostrou-me sua face comedida (sem evitar a criatividade - observem como ele brinca fazendo variações, usando com precisão as peças do seu instrumento). Aqui não tem porrada - só notas bem postas sustentando o passeio de Herbie. E Al McKibbon, o baixista? Meus amigos, seu modo de tocar é irrepreensível. As harmonias dos temas de Nichols são um prato cheio para o velho Al mostrar sua maestria, destilando um acompanhamento preciso - daqueles que deixam qualquer músico feliz - Al é um porto seguro.

Deixarei duas ali no podcast Quintal do Jazz.

O link: Avax

PS: Esse disco está incluído na caixa The complete Blue Note recordings.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

O amor é lindo!

Domingão (escrevo na segundona, à 00h:23'). Fui com meus filhos ao cinema. Era um desses romances juvenis modernos: Lua nova. Achei uma b****! Avaliação: quatro pinicos. Tentativa chula de representar as transformações amorosas juvenis. Minha filha (13 anos) não gostou. Não perguntei a razão. Deveria. Meu filho (10 anos) gostou. Sei que ele anda apaixonado por sei lá quem - como ainda não tem cabelo no sovaco, achei razoável.


Ah, o amor. A cada dia uma versão nova. Podem anotar. Suas experiências. Se não mudarem, procurem um analista. A não ser que as considerem boas, obviamente. Para mim, as experiências ruins foram justamente fruto da inexperiência. Hoje, os encontros são escolhidos com um misto de razão e intuição. A razão diz: "isso não vai dar certo". A intuição rebate: "vai fundo, mané! Quais estórias você poderá contar para seus descendentes se não se arriscar?"


Hoje, eu sinto boas saudades. Aprendi a ver o belo, retrospectivamente (com alguns senões - nem tão Polyana assim), naquilo que a maioria pode considerar desastre. Permito-me arriscar. Até mesmo reviver - recalcular o desastre passado.


Enquanto enchia a cara no Cochicho (boteco vitoriano) com um amigo, comentei sobre o tema. Deixem-se levar, meus caros. Lembrem-se apenas que toda estória tem fim. As tais pedras no caminho. Não as reneguem. Podem render estórias interessantes.


Experiências novas... As reticências são justificáveis. O novo é estranho. Ouço algo que sonoramente não é tão novo assim (enquanto poposta musical): Sky and country, do grupo Fly. Fazem parte do grupo Mark Turner (tenor e soprano), Larry Grenadier (baixo) e Jeff Ballard (bateria). Um trio, pois. A formação me agrada, desde quando ouvi os trios de Rollins. O som é bem ao gosto da ECM, cheio de experimentações e devaneios sonoros, predominando um certo lirismo que rompe com as velhas canções. Sim - é meio cerebral. Mas parece que esse é o novo campo gozoso. Estória que remonta ao bebop. Lembro-me de ter lido em uma faixa em um filme de um show de bebop: "por favor, não dancem" - ou algo similar. Música para ser ouvida, para dançar com a cabeça.


Confesso que achei divertido ouvir como a rapaziada brinca com seus intrumentos. Baixo, bateria e sax se revezam num jogo interessante de condução dos temas. Enfim, são novas maneiras de se contar estórias. Se nos permitirmos a experiência de ouvi-las, pode ser que surja mais um bem vindo caso de amor.

Ouçam ali no podcast Jazz Contemporâneo.

Link: Avax

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

O mago das vassourinhas

Apresento-lhes um baterista mucho loco: Chico Hamilton.

Ele fez parte de uma geração e tanto. Enquanto estudava na Thomas Jefferson High School (segunda metade dos anos trinta), fez parte de um grupo com figurinhas como Dexter Gordon, Wardell Gray, Charles Mingus e Illinois Jacquet. Querem mais? Durante a guerra, no exército, pegou umas aulas com o soldado Jo Jones. Depois disso, enfileirou performances ao lado dos grandes nomes do jazz.

Sua fase mais experimental começou com o grupo pianoless que fundou com o baritonista Gerry Mulligan, em 1952. Foi nesse momento que, de acordo com o encarte, Chico desenvolveu sua habilidade com a vassourinha e sua capacidade de brincar com o tempo e o ritmo. Daí em diante, nosso herói seguiu uma trilha que vai do som mais camerístico até o fusion.

Estou às voltas com o cd The Original Chico Hamilton Quintet - complete studio recordings, com a participação de Buddy Collette (sax alto, flauta, tenor e clarineta) e Jim Hall (guitarra). O quinteto se completa com Fred Katz no cello e Carson Smith no baixo. As 20 faixas que compõe o cd foram gravadas em sessões no período 55-56. Apesar do título, o disco traz cinco faixas gravas ao vivo na Califórnia. O som tem alguma dose da terceira via, um pouco do bom e velho cool e a exempar performance de Chico. Vocês poderão atestar a competência de Hamilton com as baquetas ali no podcast Quintal do Jazz.

Link: Avax

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Onde ouvir jazz em Vitória



A segunda-feira é dominada pela Plataforma 16, quiosque situado na Curva da Jurema, praia próxima à Ilha do Boi. O jazz fez daquele point a sua moradia há 10 anos. Por lá circulam os melhores músicos da ilha e arredores. O clima é totalmente descontraído e o cenário é deslumbrante. Não espere luxo do boteco, pois nada que o lembre existe por lá - a não ser a música, obviamente. O som começa às 21:00h.



Frequentado por intelectuais e artistas da cidade, o tradicional bar da Rua da Lama, Cochicho da Penha, em Jardim da Penha, dá lugar ao jazz às terças. O som é sempre de primeira. O boteco tem um menu extenso, com quarenta opções de pratos e petiscos (coisas leves como pé-de-porco e mocotó fazem parte do cardápio). A cerveja bem gelada é característica da casa. O clima é mais que relaxado.



Na quarta-feira, o jazz aporta no Jazz Café, barzinho mais sofisticado situado no triângulo das bermudas, Praia do Canto. A nova proprietária, Kátia Brinco, resolveu reabrir o espaço jazzístico (que havia sido abandonado pelo dono anterior). A rapaziada tem comparecido e as jams têm acontecido.





Quinta-feira é dia do Bellia, restaurante que, além dos bons pratos e bons vinhos, tem servido uma boa dose de jazz, aos cuidados do pianista Pedro Alcântara e do baixista Afonso Abreu. O restaurante fica na rua Joaquim Lírio, Praia do Canto.



Nos finais de semana quem comanda o jazz é o Spirito Jazz, casa de shows com ótima estrutura, boa decoração, bom som e tudo mais. Helcias, o proprietário, tem feito uma programação interessante, unindo músicos locais e grandes nomes do cenário nacional. O endreço: Rua Madeira de Freitas, 244, 1º piso do Via Cruzeiro Mall, Praia do Canto - Vitória/ES *Referência: em frente ao Yazigi da Praia do Canto

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

What is this thing called love?

Basta dar uma pequena olhada nas letras do cancioneiro mundial para constatar que a temática predominante é o tal do amor. Fraternal, paternal, maternal, erótico (em suas mais diversas perversões, zoológico inclusive - vide a famosa Mula Preta), tá tudo lá, nos mais variados ritmos e estilos, numa infindável enciclopédia amorosa musical.


Um capítulo muito interessante dessa enciclopédia foi escrito por um dos compositores mais interpretados pelos jazzistas: Cole Porter. O camarada tem uma dicção peculiar, que o distingue dos outros grandes nomes. A união de boas doses de cinismo e ironia com um indefectível eixo lírico bastante sofisticado permitem uma face sempre vivaz à emoção que perpassa suas letras. O amor, para ele, é sempre visceral e avassalador, dominando rapidamente aqueles que estão ao seu alcance, ou seja, todos. Mas Porter não é aquele tipo lamurioso. Pelo contrário, da união de seus versos com a sua música o resultado tem sempre algo solar, luminoso, pra cima, alegre (que aqui não significa necessariamente música em up tempo).


Amar de todas as maneiras possíveis parece ser a premissa de Porter. "Qualquer maneira de amor vale amar", poderia ter-nos dito. Mas ele diz isso de outro modo - como nos diz/convida na divertida Let's do it, let's fall in love (da qual Chico Buarque fez uma boa versão), vamos amar pois ninguém escapa disso. Todos amam: chineses, pingüins, canários, até os argentinos. Creio que essa pode ser uma resposta para a pergunta "What is this thing called love? This funny thing called love?"


Entreguem suas armas, companheiros. A tentativa de fuga não resultará em nada, como destaca Porter em I've got you under my skin. O desejo é irresistível, impossível de ser combatido. Mesmo sabendo que o lance é uma roubada, mesmo sabendo que a coisa não vai dar certo, mesmo com a vozinha repetindo no ouvido "Don't you know you fool, you never can win/Use your mentality, wake up to reality", acabamos cedendo e nos entregando aos braços da musa, pois ela é a realidade que importa.

Ouçam ali no podcast Quintal do Jazz


domingo, 8 de novembro de 2009

Blues cross country

Estou aqui tentando lembrar de algum branquelo ou branquela que convença cantando blues. Ninguém me vem à mente. É possível, isso sim, encontrar algum disco honesto, bem arranjado, com bons músicos acompanhando o dito cujo. Mas fica por aí.

Dia desses, em meus diários passeios pela web, deparei-me com um disco curioso. Chamou-me a atenção o título: Blues cross country, gravado em 1961. Como sugerido, é um passeio por diversas cidades e regiões dos EUA representados nas letras de músicas desse envolvente estilo. De Los Angeles, passando por Kansas City, até chegar em New York, do oeste ao leste, do norte ao sul, todos devidamente amarrados em 14 bons blues.

Proposta mais que interessante e que mais interessante fica quando a cozinha fica por conta da orquestra de Quincy Jones (que cuidou dos arranjos, exceto dois que ficaram aos cuidados de Benny Carter e Mandell). As reticências surgem quanto à intérprete. Trata-se da Pat Boone de saias, miss Peggy Lee. A menina é afinadinha e coisa e tal, mas está mais para noviça rebelde do que para cantora de blues - falta mojo. Isso não chega a matar o disco, mas abala. O resultado final não é ruim, achei até agradável. É daquele tipo de disco que a gente pode deixar rolando enquanto folheamos o jornal ou lemos o romance do dia.

Ouçam ali no podcast Quintal do Jazz

Link: Avax

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Vocês conhecem Edmund Gregory?

O que agora ouço já mereceu outro post aqui no nosso quintal. Trata-se do baritonista Sahib Shihab. Aliás, ele também encarava o sax alto, e, diga-se passagem, muito bem (vocês ouvirão).

Pois bem, encontrei uma coletânea intitulada Jazz Sahib: Complete sextets sessions 1956-1957, lançado pela Fresh Sound. O nosso herói, nascido Edmund Gregory, antes de, como muitos outros, ir tentar a vida na Europa, participou de alguma sessões (Savoy) que, ao meu ouvir, ficaram muito interessantes.

Além do Jazz Sahib (aqui postado), as faixas do cd duplo derivam das coletâneas Night people, After hours jazz, The jazz we heard last summer e Jazz is busting out all over. Nesses discos, encontramos Shihab sempre muito bem acompanhado (confiram na capa) e destilando o seu melhor veneno. Selecionei duas faixas para o deleite do visitante. A primeira, Hum-bug, gravada em 56, conta com a participação de Eddie Bert (trombone), Tommy Flanagan (piano), Kenny Burrell (guitarra), Carl Pruit (baixo) e Elvin Jones (bateria) - quase esqueci: Shihab, aqui, pilota o sax alto. A segunda faixa, Blu-A-Round, vem com Sahib (barítono), Phil Woods (alto), Benny Golson (tenor), Bill Evans (piano), Oscar Pettiford (baixo) e Art Taylor (bateria).
O link: Avax

domingo, 1 de novembro de 2009

Ventura & Phillips

Alguns encontros são por acaso, outros contam com uma forcinha de amigos, admiradores que dizem: "fulano foi feito pra cicrano", "Como ainda não se conhecem?!? São almas gêmeas!", e por aí vão, inventando estórias, criando romances, semeando esperança de que alguma coisa possa dar certo nesse e noutro hemisfério. O problema é que costumamos confundir "dar certo" com "perenidade". As coisas dão certo durante um tempo. Sim. E aí resta aquele lance do "eterno enquanto dura". Bem, as coisas permanecem na memória - pelo menos até que o velho Al nos pegue morro a baixo.

Ainda estou com essa idéia na cabeça, a do encontro/desencontro, desde que a epifânica e evanescente musa azul por aqui aportou e desaportou. Mas, além da goiabada com queijo, algumas outras duplas caem muito bem. A Mosaic, para não perder o bom costume, forçou um encontro numa de suas aprazíveis caixas: Joe Ventura e Flip Phillips. Um e outro excelentes saxofonistas. Dois gentlemen no trato com seus instrumentos, como bem destaca o encarte da caixa.

Ambos descendentes de italianos que, para nosso gáudio, abdicaram de seguir o caminho da "cosa nostra" e investiram na música. Flip (tenor), até onde eu sei, é uma cara centrado; Ventura (que encara o tenor, barítono e baixo), no entanto, levou uma vida mais desregrada, descambando pro universo da cachaça, o que atrapalhou bastante a sua produção. Mas o que interessa é que ambos tocam pra caramba.

A caixa da Mosaic - The complete Verve/Clef studios sessions - contém seis cds com excelentes gravações (dois para a obra de Ventura e e quatro para a de Flip). Pode desembolsar a grana e levar para casa. Satisfação garantida.

Ouçam uma alentada seleção ali no podcast Quintal do Jazz.

Link: Avax