A quarta-feira, dia em que dedico oito/nove horas à tarefa de ouvir música, momento prazeroso, foi bastante tensa na semana passada. A minha sempre tranqüila viagem para São mateus, onde ministro singelas aulas, fugiu à normalidade. Estava no ônibus, semi-adormecido, ouvindo o disco Heard it all before, de Jamie Cullum, jovem pianista e cantor inglês de sugestivo sobrenome latino, quando um baque interrompeu minha audição de sua interpretação de night and day. Pensei em um pneu, mas não foi. Atropelamos cavalo e cavaleiro. O primeiro finou-se ali mesmo, o segundo sobreviveu - muito machucado. Seria suficiente para um bom período. Mas não parou por aí.
À tarde, o retorno ao lar. Dessa vez embalado pelo guitarrista Martin Taylor, Solo (2002), senhor de uma técnica mais que convincente - daqueles que dispensam acompanhamento. Ouvia uma versão excelente de In a mellow tone quando, pela janela, vi um caminhão com a lateral esquerda bastante danificada, motorista ainda dentro. Pouco a frente, fumegante, uma dantesca escultura de metal contorcido. Alguém deveria estar lá dentro. Agora, metal, ossos e sangue se unem. Transformers. Entre ohs e repentinas conversões pensei sobre nossos caminhos. A tecnologia só nos fornece novos modos de morrer. Apesar de todos os esforços para domesticá-la, a morte se mantém patética. Mais, até.
Voltei-me para a música, dormi e não sonhei.