sexta-feira, 20 de maio de 2011

Rugolo


Camarada, a dor dói mais quando está sarando. Lógica infernal. O tecido novo, cicatrizante, está mais sensível. Trocar o curativo, hoje, foi uma experiência vertiginosa. Lembrei-me de um poema que escrevi por outras dores há alguns anos. Parece que mandou uma irmãzinha para se vingar:
Sim,

não tive pena da Dor

e a sufoquei sem piedade.

Deixei-a gemer e espernear

– criança sem palavras –

e ela uivou pra lua

como uma loba no cio.

Sem dó arranquei suas unhas e presas

e a deixei sangrando, indefesa,

à mercê de outras, famintas,

da sua espécie.

Sim,

e quando a fúria, impotente,

brotou em seus olhos

eu os furei com ferro quente.

Ó Dor, cega e muda,

por mim esquartejada

e abandonada aos cães:

não sei do seu sepulcro,

não li sua lápide

e não te ofereço nenhuma prece.

Agora, chuva chovendo na minha janela, busco algum bálsamo para a dolorosa mordida do destino. Arrisco-me com um maluco que tinha entre seus ídolos Stravinsky e Bartok. O nome do camarada é Pete Rugolo, compositor e arranjador californiano, maluco e querido por todos os jazzistas da costa oeste.

Rugolo gravou alguns discos com formações pouco ortodoxas: dez trombones e dois pianos, dez trumpetes e duas guitarras, dez saxofones e dois baixos; gravou também um disco dedicado à percussão. O cd que estou escutando reúne os quatro discos citados: Exploring new sounds. Aqui você poderá ouvir quase todos os grandes músicos de jazz daquelas plagas. Viagens mil. Deixarei quatro faixas na radiola.

Link: Avax


10 comentários:

Angela disse...

Salsa,lendo a sua poesia me lembrei de outra de Fernando Pessoa:

"O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm"

Estimo melhoras,

Beijos,

Ângela

João Luiz disse...

Elaborou arrranjos para a orquestra de Stan Kenton durante algum tempo, passeou também pela música pop, por temas de filmes e outros "babados". Para quem gosta de grandes orquestras, Pete Rugolo pode ser uma boa pedida. Este álbum, mr.Salsa, bastante interessante, reune feras do "cool jazz" como Pete e Conte Candoli, Don Fagerquist, Frank Rosolino, Russ Freeman, Larry Bunker, Red Mitchell, Shelly Manne e até Laurindo de Almeida. Boa pedida mr.Salsa, e, quanto as suas feridas, ótimo que elas estejam doendo, sinal de boa cicatrização. Continue fazendo poesias e ouvindo jazz que por certo as dores serão atenuadas.

olmiro muller disse...

Para alguns, Pete Rugollo foi o "alter ego" de Stan Kenton. Por influência de Rugollo, Kenton tentou implantar o tal de "jazz progressivo" (3ª corrente?), mas fracassou.
Quanto a motos, nunca subi no "lombo" (termo gauchesco) de uma. Falta coragem.

Rogério Coimbra disse...

Meu caro poeta,

A dor existe.
Torço e contorço para que a dor vá,
com La Nave Va e
você fique no quintal do jazz
chupando pitanga.

Recupere-se.

Sergio disse...

Ando a cata de completar esse álbum como fosse aqueles de figurinha, com aquelas dificílimas... Infim, bela poesia, mr.

Quanto ao acidente e as ralações, lembrou-me um episódio tragicômico. Nera moto, era bike, corriam os 80's, no início da década, resolvi descer a ladeira do Horto, bairro quase rural, ou melhor, florestal do Rio – a pista, subindo direto, dá lá no Cristo. No meio do caminho há uma cachoeirinha, quase um pointzinho carioca. Amigo, na descida de bike, a vaca foi tão premiada que dei entrada em grande estilo, de ambulância no hospital. Em lá chegando, me deitaram numa maca e quando o médico me deu uma boa olhada perguntou, "como se machucou assim, amiguinho?", E eu respondi, "tombo de bicicleta.". E o médico de bate pronto: "Foi a 1ª vez que andou?".

Ralar o corpo no asfalto, meu camarada, não deve ser muito menos dorido q rolar desembestado num tapete em brasas.

Melhoras!

Salsa disse...

putz, bro. Desceu a pirambeira na "banguela"?!? É isso, a gente precisa ralar para aprender...
Grandes Olmiro E Coimbra,
Viajar é preciso.

Paula Nadler disse...

Bardo Salsa, lendo sua poesia lembrei de vovô Acácio, que dizia: nunca transporte seu oboé numa Norton. A queda é certa. Isso foi na época em que quebrou o nariz pela primeira vez num acidente de motocicleta. Bons tempos...

Beijos!

Salsa disse...

Soube que Lester também deu seus mergulhos no asfalto... é verdade, paulinha?

figbatera disse...

Em questão de motos, estou fora!
Quanto à música, me insiro de cabeça...

Salsa disse...

DEIXA DE BOBAGEM, FIG. QUANDO MINHA PEQUENA ESTIVR INTEIRA, EU TE LEVAREI PARA UM PASSEIO. RS