terça-feira, 27 de abril de 2010

Chá inglês

A noite passada fez-me lembrar minha passagem pelo México na minha desenfreada busca pelo maço de Continental. Foi lá que fui forçado a repensar minha pretensa blindagem contra alimentos exóticos. A maldição de Montezuma me pegou morro a baixo. Triste passagem que ontem se avivou após almoço em um restaurante japonês.

Ainda convalescente (são 16:22h), tomei um chá com torradas e, movido pelo clima britânico, coloquei na vitrola o disco It's Morrissey, man!, gravado em 1961 pelo tenorista inglês Dick Morrissey e seu quarteto para o selo Fontana. O quarteto se completa com Stan Jones (piano), Malcolm Cecil (baixo) e Colin Barnes (bateria). Achei esse disco (e outro que apresentarei depois) no mercado de pulgas de São Francisco, na Califórnia.

Esse é o primeiro gravado por Morrissey. A sonoridade encorpada do seu tenor, acrescido de um vocabulário ultrafluente e temas em up tempo (os temas mais slow também são muitíssimo agradáveis), tornam esse disco um dos mais palatáveis que apreciei ultimamente. Pedreira pura, que quase me fez perder a cabeça e tomar uma dose do puro malte que está trancado no bar.

Deixarei três faixas para vocês avaliarem. Curtam a leitura de St Thomas e mais Cherry Blue e Happy feet.

O link: Avax



quarta-feira, 21 de abril de 2010

Os Poemas brasileiros de Wanderson Lopez

Conheci Wanderson Lopez há dez ou quinze anos, aproximadamente. Era um jovenzinho elétrico (capixaba da gema) querendo tocar jazz. Mostrou-me a sua guitarra e dedilhou suas cordas com o ímpeto dos jovens: muita paixão, muitas notas, voluptuosas notas revelando a sua autodidata alma musical. Naqueles dias, Wandinho, como seus amigos o chamam, já mostrava ser um grande músico - mais do que somente um músico de jazz - e que estava burilando uma peculiar assinatura musical.

Na semana passada, ele aproximou-se de mim e mostrou-me um cd, o seu primeiro cd: Poemas brasileiros, que será lançado em breve - aqui e na Europa (na Itália, para ser preciso), fruto de longos meses de árduo trabalho. Cheguei em casa de madrugada e resolvi ouvi-lo enquanto me preparava para o merecido sono. Logo nos primeiros acordes, o sono se foi e deu lugar à necessidade de ouvir todos detalhes que Wandinho usou na confecção do seu trabalho.
Wanderson Lopez mostra, em Poemas brasileiros, que o jovenzinho impetuoso de há dez anos ainda mantém a verve que o movia, a paixão, mas com o tratamento que a vivência propicia a algumas almas sensíveis. Suas composições revelam boas influências do erudito e do pop, que se articulam com particular eficiência, produzindo um resultado bastante convincente.

A Suíte brasileira, que abre o disco, dividida em quatro movimentos (Poemas, Brasileiros, Abrigo e Casa de Baden), passeia pelo baião, pelo choro, pela valsa e pelo afro-samba. Poemas traz um sabor mais erudito em que os violões são explorados de modo eficaz. O estiloso choro Brasileiros, com a participação do irrepreensível gaitista Gabriel Grossi (que participa em mais duas faixas), é um momento e tanto. Abrigo, o terceiro movimento, é uma valsa que se divide em três, sendo cada parte um estilo bem definido - pitadas de um lirismo erudito com uma brisa metheniana (aqui Wanderson conta com o apoio de Pedro Alcântara ao acordeon). A Suíte se completa com uma bem feita homenagem ao grande Baden Powel. Essa peça já seria uma boa justificativa para a edição do cd.

Para nossa sorte, o disco ainda tem muito mais. Além das bem estruturadas composições de Wandinho, o violonista, baixista e bandolinista nos brinda com boas interpretações de composições de grandes contemporâneos: Toccata in blues (Domeniconi), Jongo (Bellinatti) e Saudade a trois (Dyens).

A empreitada foi realizada com a participação dos músicos Pedro Alcântara e Fabiano Araújo (acordeon), Edu Szajnbrum (percussão), Diego Frasson (bateria) e Gabriel Grossi (gaita). Wandinho cuidou dos violões, bandolin e baixo.

Serviço:
CD: Poemas Brasileiros
Cotação: ****
Selo: Independente
Vendas pelo email wandersonlopez@hotmail.com
Confiram Brasileiros:

domingo, 18 de abril de 2010

Dempsey Wright - Hokum guitar

Cacilda, como está difícil achar um maço de Continental sem filtro! Tive que rodar mais de dois meses para encontrar o danado. Enfim, consegui encontrar. Comprei um pacote e retornei ao abandonado quintal.

A dificuldade para encontrar o cigarro, no entanto, permitiu-me alguns bons momentos. Enquanto descansava em uma pequena loja numa perdida cidadezinha de Oklahoma, terra de Charlie Christian e Barney Kessel, mas que também não tinha a ansiada marca de cigarro, eu ouvi um disco de um outro dileto filho daquelas plagas: Dempsey Wright. Sim, senhores, é outro guitarrista (o ninho deve ser em algum lugar das montanhas daquela erma região).

O velho montanhês, ao perceber que eu estava curtindo o som, me perguntou "D'ya enjoy hokum?". Sem entender, pensando que era o petisco à base de fumo e couro de jegue que ele mascava entre uma pitada e outro no cachimbo de sabugo de milho, disse-lhe que dependia. Conversa vai, conversa vem, ele me explicou que se tratava do estilo de música (para mim era o bom e velho westcoast). O velhote, ao fim do papo, emocionado com a minha empedernida busca pelo maço de continental, presenteou-me o lp do seu conterrâneo.

Conta-nos o próprio guitarrista, na contra-capa do Lp, que ouvia jazz desde a sua mais tenra infância. Aos doze já encarava algumas gig (ia à cavalo). Gostava de ouvir Venuti, Grapelly, Stuff Smith e Eddie South. Para nossa sorte ele abandonou o violino (seu primeiro instrumento) e começou a tocar guitarra.

No início dos anos cinqüenta, Dempsey foi para a Califórnia, onde consolidou sua carreira de guitarrista. Seu som é límpido como as águas dos riachos que descem as montanhas da sua terra natal. Refrescante. O disco The Wright approach, o primeiro de Dempsey como líder, gravado em 1958, conta com a nata dos jazzistas californianos: Richie Kamuca, Stan Levy e Ben Tucker. É som pra várias audições. Confiram aí na radiola.
O link: Avax