domingo, 26 de setembro de 2010

Singer, Hal Singer


Em 1919, em Tulsa (Oklahoma) - cidade que eu conheço em função dos inúmeros livros de bolso que meu velho comprava (bang-bang), nasceu um camarada chamado Hal Singer. Passados 91 anos, enfim, o conheci.
Singer é um tenorista. Seu sopro lembrou-me uma mistura de Hawkins com Webster (ele afirma que seus sax heroes são Hawkins e Byas), e seu fraseado traz marcas de r&b. Isso se explica pelo período de 10 anos (49-58) em que acompanhou músicos desse estilo.
O disco que agora ouço, Blue stompin', gravado em fevereiro do bom ano de 1959, Singer se fez acompanhar pelo excelente e solar trumpetista Charlie Shavers, pelo descolado Ray Bryant ao piano, Wendell Marshall ao baixo e Osie Johnson à bateria. A sonoridade é clássica, remetendo-nos mais aos anos quarenta do que à década em que o disco foi gravado. Mas o resultado está bom.
A união do som de Singer com o de Shavers não deixou arestas. Parece que foram feitos um para o outro. Desde a faixa-título, em que os dois grandes instrumentistas brincam como se estivessem em um parque de diversões, fazendo diversas citações em seus improvisos, passando pelo balanço de Windy (na qual Shavers usa surdina), pelo swing de Fancy pants ou na websteriana balada With a song in my heart, a química entre os dois foi perfeita.
Curtam Blue stompin', Midnight e Fancy pants na radiola.
Link: Avax


quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Sábado 18/09 - a última noite do Tudo é Jazz 2010

Beber, comer, ouvir música. Essas coisas não podem ficar por conta do azar. Por isso, munimo-nos de precauções para que maus encontros não aconteçam, afinal, como nos alertou o escritor mineiro: "viver é perigoso".
Houve, no passado, experiências desagradáveis nos dois primeiros quesitos citados acima. No entanto, seguindo a solicitação de amigos, retornei ao Bené da Flauta, restaurante bastante louvado por aqueles que o freqüentam. Fui e não me arrependi.
Desta feita, o serviço foi eficaz (considerando-se o grande número de clientes) e a comida estava aprazível. Pedimos (eu, Zezé e Victor) pratos comuns ao universo butequinesco: língua e rabada. Ambos os pratos (com temperos mais sofisticados do que os encontrados em outros recintos) mantinham textura delicada que ainda povoam minha memória. O chopp gelado e a cachaça de boa índole casaram perfeitamente com os pedidos.
Melhor ainda ficou com a boa música do quarteto liderado pelo saxofonista Chico Amaral. Enfim, isso é o que eu posso chamar de um bom início de jornada.

* * *
Aguardei o segundo show da noite: Nnenna Freelon. Confesso que não a conhecia, por isso a impressão aqui exposta será relativa à sua apresentação. A bela representante dos afrodescendentes, ao adentrar o palco e emitir as primeiras notas com a sua sensualíssima voz, capturou de imediato a atenção deste pós-balzaquiano ouvinte. O quarteto que a acompanhou demonstrou equilíbrio suficiente para emoldurar suas belas interpretações. Brindou-nos a musa com, entre outros temas, I love you, Get out of town (de Porter) e uma envolvente Skylark mandada apenas com voz e baixo. Essa última eu faço questão que vocês confiram no vídeo:

A noite nos trouxe, em seguida, o nonagenário Jon Hendricks esbanjando energia ao lado de sua filha Aria e do tenor Kevin Burke, relembrando peças do repertório do sensacional trio vocal Hendricks, Ross & Lambert. Destaque para o quarteto que acompanhou esse ícone do jazz, que mostrou ao público presente o que é que o swing tem. Assistam e digam o que acham:
Encerrando a noite, entra em cena um trio de trumpetistas para ninguém botar defeito: John Faddis, Cláudio Roditi e Stafford. O bem-humorado Faddis (fazendo questão de mostrar os seus impressionantes agudos) comandou o grupo e levou o público para um passeio sensacional pelo universo musical do jazz de Louis Armstrong.
Abro parênteses para destacar a bela interpretação de Body and soul levada por Roditi, em singela homenagem a um amigo recentemente falecido. Vocês poderão curtir a versão de Mack the knife no vídeo:

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Sexta básica - Tudo é jazz 2010

Após a pausa para umas doses de puro malte e cervejas belgas, retornamos para mais um show. O terceiro da noite de sexta ficou por conta da versátil violinista Regina Carter, que já tive o prazer de conhecer no festival de Rio das Ostras há dois ou três anos.
Ao contrário daquele momento, ms. Carter veio com uma formação mais acústica, fazendo um som carregado de influências africanas e com boas doses de lirismo. O quarteto, apesar do clima mais introspectivo de algumas peças que nos remetiam às planícies e desertos africanos, conseguiu manter o público atento à apresentação. Para este que vos tecla, o melhor momento do show foi o tema dedicado a New Orleans, composto pelo baterista da banda, com irrepreensível mandada com elementos cajun. Apreciem um pouco no vídeo (a bateria acabou, interrompendo a filmagem):


O quarto e último show foi defendido pelo trio do baterista Antonio Sanches, considerado um dos melhores da atualidade. Em sua apresentação nada discreta, o líder fez questão de mostrar todo seu arrojado e voluptuoso vocabulário com os tambores e pratos de sua bateria. A coesão do grupo é realmente impressionante e a volúpia parece ser a característica que melhor define a performance do trio. Zenon, como disse um companheiro ao lado, parece não respirar ao tocar seu sax alto. O baixista, como sempre acontece nesse tipo de formação, foi bastante exigido e não deixou a peteca cair.

Os temas longos (foram cinco de, em média, 15 minutos) e a dicção contemporânea da música tocada, no entanto, causaram alguma apreensão e tensão neste ultrapassado comentarista. Mas, não há como não admitir, o trio mostrou que conhece o assunto.

PS - Como a bateria da câmera havia descarregado, recorri à máquina fotográfica e consegui capturar apenas um fragmento da apresentação:


domingo, 19 de setembro de 2010

Tudo é Jazz 2010 - sexta-feira, 17 de setembro


O caminho para Ouro Preto continua no mesmo lugar. Inclusive, em determinadíssimo ponto da fronteira ES/Minas, ainda existe a cidade mais feia do Brasil: Manhuaçu. Como das vezes anteriores, fui obrigado a atravessá-la lentamente por causa dos inúmeros quebra-molas e radares (50km/h). Surpreendi-me, no entanto, com o esforço de alguns moradores em serem rebaixados no infame rankink: havia algumas casas (furando o esquema das casas sem reboco) pintadas com vivíssimas cores.

* * *

Seis horas de estrada e enfim, chegamos ao berço do já consolidado festival de controvertido nome: Tudo é Jazz, que esse ano homenageia o bom e velho Satchmo, a.k.a Louis Armstrong.
Infelizmente não pude assistir o meu herói Joshua Redman, que se apresentou no dia anterior ao lado de Eldar, o jovem filho das estepes russas. Segundo os amigos que assistiram o show, a participação de mr. Redman salvou o império russo de mais uma queda.

* * *

Após breve périplo etílico-gastronômico pelos butecos ouropretanos em companhia de meu filho Victor e da amiga Zezé, segui para para o Parque Metalúrgico, onde acontecem as apresentações musicais.
A noite de sexta foi aberta com o show do para mim desconhecido grupo Rabo de Lagartixa, que passeia com elegância pelos gandes compositores da nossa música. O clima é predominantemente choro - muito bem executado, diga-se de passagem. Destaque-se os arranjos para algumas peças de Villa-Lobos. Como diz meu amigo Wilson Garzon "nem tudo é jazz, mas não deixa de ser interessante". Curtam aí um pouquinho de Villa-Lobos:




Lá pelas tantas, a primeira jam da noite. O grupo Rabo de Lagartixa recebe Anat Cohen para tocar um teminha do homenageado da vez: Louis Armstrong. Curtam um pedacinho:



O segundo show da noite foi com o 3 Cohens. A já conhecida tribo Tel-Aviv/New York mais uma vez não decepcionou. Avishai, Anat e Yuval, a cada dia que passa demonstram maior maturidade e desenvoltura com seus instrumentos. Suas apresentações sempre primam pela alegria, aspecto que coaduna perfeitamente com o espírito festeiro de Armstrong. Vocês podem sentir o clima ouvindo e vendo a interpretação de Cheek to cheek:


Lá pela tantas, os irmãos Cohen recebem a serelepe visita do arcano dos cantores de jazz: Jon Hendricks. Do alto dos seus oitenta e nove anos (ou mais), o papa dos vocaleses, apesar da voz já calejada pela longa história a serviço do jazz, ainda demonstra energia suficiente para balançar a platéia. Divirtam-se com o vídeo:


PS - Fui obrigado a reduzir a qualidade dos vídeos para postar no youtube. De qualquer modo, valeu a intenção. Depois eu apresento um pouco mais das outras atrações.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

O som do órgão


Amanha cedo partirei para Ouro Preto. A intenção é curtir o Tudo é jazz, festival anual que lá acontece. Confesso dantanho que vou não muito empolgado. O show que eu gostaria de assistir seria o do jovem pianista (já nem tão jovem assim) Eldar e Joshua Redman, que acontece hoje. Ou seja, perderei o que me interessa. Mas vou assim mesmo, em nome do jornalismo verdade.
Na bagagem, levarei um disco (dois, aliás) de um instrumentista que nunca mereceu maiores comentários aqui neste espaço. Eu o achava enfadonho (ainda me incomoda quando ele estica em demasia os acordes/notas - e ele faz isso nesse disco também). Digo achava porque tenho que admitir, após reconhecer um boa dose de preconceito em minha aversão ao som do órgão, que Jimmy Smith é um músico ímpar. Sua capacidade de criar longos discursos sem se repetir é impressionante.
Ouvi algumas vezes a primeira faixa do disco Live at the Club Baby Grand v. 1 - Sweet Georgia Brown - movido pela curiosidade suscitada pela observação do autor das liners notes do cd. Segundo ele, são quarenta chorus sem se repetir. Não contei para conferir, mas é um fato que Smith constrói uma intrincada e bela rede de frases em seu improviso. Realmente impressionante.
Acrescentemos ao bolo a boa presença do para mim desconhecido guitarrista Thornel Schwartz que, apesar de não ter tido tanto espaço como solista (teve mais espaço no volume 2, que inicia com uma boa versão de Caravan), soube aproveitar os momentos para mostrar sua habilidade (como harmonizador é excelente). A bateria de Donald Bailey soou-me bastante versátil, apresentando facilidade em administrar as alterações rítmicas e preenchendo os espaços com acentuações muito bem postas, mantendo uma "parede" harmônica firme e bem decorada.
A gravação é de 1956 e merece a atenção dos que curtem o som de Jimmy Smith. Eu gostei mais do volume 2, pelo espaço cedido ao guitarrista e pelo clima mais leve. Ouçam ali na radiola.
Os links: Avax 1 Avax 2


sábado, 11 de setembro de 2010

Predador e o viking


O Predador, intergalático visitante, sugeriu-me um post sobre um guitarrista cujo nome sugere origem viking: Ulf Wakenius. Pois bem, achei alguns na rede; outros já os possuía, como é o caso do cd em que Ray Brown toca com seus amigos guitarristas e os gravados com o finado pianista Oscar Peterson.
Mas o que está na minha radiola é um disco gravado em 1994, New York meeting, em que esse pouco conhecido guitarrista demonstra sua habilidade tanto com a guitarra quanto com o violão. Suas interpretações têm um colorido contemporâneo e soam claras, sem preciosismos, com uma simplicidade surpreendente e envolvente.
Acompanham-no nessa sessão Niels Lan Docky (piano), Ira Coleman (baixo) e Billy Hart (bateria). O repertório é recheado por standards e algumas composições dos membros da banda, sempre muito bem conduzidos pelo grupo. Prestem atenção nas peças em que mr. Wakenius ataca de violão solo (Crazy he calls me e Georgia on my mind, especialmente). Recomendo.
Ouçam Bernie's tune, New York meeting, Angel eyes e Georgia on my mind
Link: Avax


terça-feira, 7 de setembro de 2010

O território de Louis Smith

O baixo acústico de Chambers soou profundo, iniciando o tema. Depois entrou um trompete de timbre encorpado, mas sem perder a ternura. Lírico. Um belo blues - Smithville - invade o final da tarde, início da noite, para deixar claro que esse território tem dono.

Desse modo, Louis Smith conquistou mais um seguidor - eu - para divulgar no emaranhado da rede o seu primoroso trabalho. Melhor ainda fica ao descobrir que ao seu lado está meu dileto Charlie Rouse, mais uma vez mostrando sua grande habilidade como instrumentista.

E começa o segundo tema - Wetu - um up tempo no melhor veio bop, em que o time mostra que entende do riscado. As frases de Louis, meu xará, são como relâmpagos cortando a noite. Magestosas. Powerful. Quase me faz esquecer de Sonny Clark extraindo pérolas do seu piano. enquanto Art Taylor conduz primorosamente sua bateria.

E assim prossegue Louis, seja blues, seja bop (ou hardbop, como queira), seja balada (Embraceable you), ele vai mostrando suas versatilidade, agilidade e sensibilidade nos temas que se sucedem. Anotem aí: Smithville, gravado em 1958, é um disco indispensável. Mando cinco estrelas em titubear.

Ouçam ali na radiola.

Link: Avax


domingo, 5 de setembro de 2010

A man from Arizona

Esse post é dedicado àqueles que acham que o estado do Arizona (EUA) só produz cactus e vaqueiros. Saibam, pois, que aquelas paragens nos legou um grande guitarrista de jazz: Howard Roberts.

Segundo o encarte, ele começou a tocar aos nove, aos onze já frequentava botecos de jazz e, aos quinze, já participava das gigs. Rapidamente, já estava encarando figuras como Dexter Gordon, Miles e Bud powell. Dizem que ele também andou flertando com o rock'n'roll, mas, para nossa satisfação, retornou ao jazz.

Apresento-lhes um disco já da segunda metade dos anos sessenta: Live at Donte's. O clima é de festa, retratado em cinco faixas longas (média de 15 minutos) em que os músicos e a platéia se esbaldam. Agradou-me o modo como mr. Roberts conduz sua guitarra - agilidade e criatividade no fraseado, som límpido e vivaz.

Howard fez-se acompanhar por um grupo de para mim desconhecidos músicos, excluído o bom saxofonista (alto, tenor e soprano) Tom Scott. Formam a Magic Band, além dos citados, Steve Bohannon (órgão), Chuck Berghofer (baixo) e John Guerin (bateria), mas que demonstram, nesse trabalho, performances elogiáveis.

O disco inicia com uma versão up tempo de All of you, de Porter, com a qual a banda faz o clube tremer e encerra com outro clássico, também em up tempo, When sunny gets blue. Ambas as versões me agradaram bastante. O interegno é preenchido por boas interpretações de Shiny stockings, All blues (apesar já estar cansado de ouvir esse tema, consegui ir até o fim) e Polka dots and moonbeams.

O resultado é bom e merece a atenção dos navegantes.

Link: Avax

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Mais um sopro

Esse é meu primeiro post concebido em Colatina, norte do Espírito Santo, Brasil. E, para esse auspicioso momento, baterei numa tecla que muito me agrada: saxofonistas. Apresento-lhes um lp de um camarada que vez e outra acompanha grandes nomes (Mingus, entre eles). Ele é dono de um sopro rascante, marcante, com linguajar que anuncia os caminhos cursados pelos instrumentistas das décadas seguintes. Refiro-me, senhoras e senhores, ao underrated Cliff Jordan.
O disco que vos apresento - Cliff Jordan - foi lançado pela Blue Note (1957) e conta com um time pra lá de bom: Lee Morgan (que, curiosamente, encabeça a lista dos músicos na contracapa), Curtis Fuller, John Jenkins, Ray Bryant, Paul Chambers e Art Taylor.
Deixarei lp desse grande nome do jazz de Chicago na radiola.
O link: Avax